segunda-feira, 7 de setembro de 2009

CIÊNCIA E FILOSOFIA

Relação entre ciência e filosofia no decorrer da história da cultura ocidental.
Conhecimento Filosófico e Científico


Introdução


A preocupação em compreender o mundo sempre fascinou o homem em todos os tempos. Em cada época, o homem formulou explicações que tentavam esclarecer a origem, o porquê e o como das coisas.
As primeiras tentativas de entendimento da realidade surgiram com o mito e a religião. A religião procurava entender os fenômenos a partir da existência de uma entidade externa, Deus, que seria o promotor dos fatos ocorridos no mundo. Nesta perspectiva, todo e qualquer fenômeno era explicado como fruto da intervenção divina.
Uma outra forma de compreender a realidade, que emergiu em todos os lugares, mas que encontrou entre os gregos uma expressão bastante significativa, foi o mito. Com o mito, o homem procurava explicar os fenômenos, O rompimento com o mito ocorreu quando os pré-socráticos, na Grécia antiga, procuraram estudar a realidade não mais na crença, mas na razão. Esse tipo de leitura é fruto da problematização, do debate de argumentos, ou seja, procurava-se comprovar o que se pensava. Era um rompimento total com as formas anteriores, pois a razão agora era a mediadora. Surgia, então, a filosofia.
A filosofia continuou, por muitos séculos, como a fonte de leitura da realidade. Somente no século XVI, com o nascimento da ciência moderna, apareceu uma nova forma de compreensão do mundo. A ciência apresentava um elemento novo no estudo do fenômeno: o método. Agora, para se compreender alguma coisa, era necessário ter um método que o orientasse.
A grande marca dessa nova maneira de estudar a realidade foi a tentativa de romper com qualquer forma de saber externo aos padrões dos métodos adotados. Entre elas, as concepções metafísicas e do senso comum. Qualquer menção a essas formas de saber eram consideradas heréticas. Surgia uma forma de saber que se propunha neutra, onde qualquer descoberta era certa e imutável
Vamos analisar primeiramente os conceitos de Conhecimento filosófico e cientifico, a seguir, os pensadores que deram origem a essas discussões, bem como, os métodos que utilizavam, e também, estabelecer questionamentos filosóficos a cerca da ciência e definir quais os objetivos da ciência.
CONHECIMENTO FILOSÓFICO

É um conhecimento, um estudo que se caracteriza pela intenção de ampliar incessantemente a compreensão da realidade. No sentido de apreendê-la na sua totalidade, pela busca da realidade capaz de abranger todas as outras, conjunto de estudos ou de considerações que tendem a reunir uma ordem determinada de conhecimentos. Consiste num conjunto de enunciados logicamente correlacionados. Sistemático, pois, suas hipóteses e enunciados visam a uma representação coerente da realidade estudada, numa tentativa de apreendê-la em sua totalidade.
A filosofia encontra-se sempre à procura do que é mais geral, interessando-se pela formulação de uma concepção unificada e unificante do universo. Para tanto, procura responder às grandes indagações do espírito humano, buscando até leis mais universais que englobem e harmonizem as conclusões da ciência.
A filosofia é um modo de pensar, é uma postura diante do mundo. Não é um conjunto de conhecimentos prontos, um sistema acabado, fechado em si mesmo. Ele é, antes de mais nada, uma prática de vida que procura pensar os acontecimentos além de sua aparência. Assim, ela pode se voltar para qualquer objeto ou assunto. Pode pensar a ciência, seus valores, seus métodos, seus mitos. Pode pensar a religião, a arte e pensar também o próprio homem em sua vida cotidiana.
O pensamento filosófico se difere do comum, pois, usa um método diferente. Usa da razão, é portanto, um método racional. O simples fato de apenas pensar, não nos permite a posse do conhecimento filosófico, posto que, pensar, é uma atividade natural do ser humano, mas ela definitivamente não é, ao menos em primeira análise, filosofia. Pensamento filosófico tem como característica intrínseca, sistematização, rigor, e até mesmo sua linguagem é extremamente precisa, embora alguns digam o contrário.
O pensamento filosófico em sua profundidade pode também ser chamado de reflexão. Esta reflexão é rigorosa, no sentido de ter um embasamento sólido, sem ambigüidades, o que exige uma certa precisão nos termos, no momento em que se busca ver os problemas de forma total. A lógica é um dos instrumentos do qual se utiliza a filosofia para cuidar das regras do bem pensar, trata dos argumentos e das conclusões através da sustentação das evidências. É mediante a lógica que confirmamos a validade formal dos argumentos.

CONHECIMENTO CIENTÍFICO

O Conhecimento Científico pode ser: real ou factual - lida com ocorrências, fatos, isto é, toda forma de existência que se manifesta de algum modo. Contingente - suas proposições ou hipóteses têm a sua veracidade ou falsidade conhecida através da experimentação e não pela razão, como ocorre no conhecimento filosófico. Sistemático - saber ordenado logicamente, formando um sistema de idéias (teoria) e não conhecimentos dispersos e desconexos. Verificável - as hipóteses que não podem ser comprovadas não pertencem ao âmbito da ciência. Falível - em virtude de não ser definitivo, absoluto ou final. Aproximadamente exato - novas proposições e o desenvolvimento de novas técnicas podem reformular o acervo de teoria existente.

Métodos

Todas as ciências caracterizam-se pela utilização de métodos científicos; em contrapartida, nem todos os ramos de estudo que empregam estes métodos são ciências. Dessas afirmações podemos concluir que a utilização de métodos científicos não é da alçada exclusiva da ciência, mas não há ciência sem o emprego de métodos científicos. Copérnico Foi um grande cientista que revolucionou em muito todo o desenvolvimento deste tipo de pensamento, porém aqui, iremos tratar dos pensadores mais aproximados, ou que mais influenciaram de forma direta a filosofia.
Feito este esclarecimento podemos afirmar que o pioneiro a tratar do assunto, no âmbito do conhecimento científico, foi Galileu Galilei, primeiro teórico do método experimental. discordando dos seguidores do filósofo Aristóteles, considera que o conhecimento da essência íntima das substâncias individuais deve ser substituído, como objetivo das investigações, pelo conhecimento das leis que presidem os fenômenos. As ciência, para Galileu, não têm, como principal foco de preocupações, a qualidade, mas as relações quantitativas. Seu método pode ser descrito como indução experimental, chegando-se a uma lei geral através de da observação de certo número de casos particulares. Os principais passos de seu método podem ser assim expostos: observação dos fenômenos; análise dos elementos constitutivos desses fenômenos, com a finalidade de estabelecer relações quantitativas entre eles; indução de certo número de hipóteses; verificação das hipóteses aventadas por intermédio de experiências; generalização do resultado das experiências para casos similares; confirmação das hipóteses, obtendo-se, a partir delas, leis gerais.

REVOLUÇÃO CIENTÍFICA

Contemporâneo de Galileu, Francis Bacon também partiu da crítica a Aristóteles, por considerar que o processo de abstração e o silogismo (dedução formal que, partindo de duas proposições, denominadas premissas, delas retira uma terceira, nelas logicamente implicadas, chamada conclusão) não propiciam um conhecimento completo do universo. Parte do pressuposto de que o conhecimento científico é o único caminho seguro para a verdade dos fatos, devendo seguir os seguintes passos: experimentação; formulação de hipóteses; repetição; testagem das hipóteses, formulação de generalizações e leis.

Ao lado de Galileu e Bacon, no mesmo século, surge Descartes. Com sua obra, Discurso do Método, afasta-se dos processos indutivos, originando o método dedutivo. Para ele, chega-se à certeza através da razão, princípio absoluto do conhecimento humano. Postula, então, quatro regras: evidência, que diz para não acolher jamais como verdadeira uma coisa que não se reconheça evidentemente como tal, isto é, evitar a precipitação e o preconceito e não incluir juízos, senão aquilo que se apresenta com tal clareza ao espírito que torne impossível a dúvida; análise, que consiste em dividir cada uma das dificuldades em tantas partes quantas necessárias para melhor resolvê-las, ou seja, o processo que permite a decomposição do todo em suas partes constitutivas, indo sempre do mais para o menos complexo; síntese, entendida como o processo que leva à reconstituição do todo, previamente decomposto pela análise, consistindo em conduzir ordenadamente os pensamentos, principiando com os objetos mais simples e mais fáceis de conhecer, para subir, em seguida, pouco a pouco, até o conhecimento dos objetos que não se disponham, de forma natural, em seqüências de complexidade crescente; enumeração, que consiste em realizar sempre enumerações tão cuidadosas e revisões tão gerais que se possa ter certeza de nada haver omitido.
O método dedutivo de Descartes foi a sua maior contribuição para a ciência moderna. A visão cartesiana terminou separando a mente da matéria, o que iria marcar profundamente a ciência posterior. Nessa visão, a ciência trabalhava com tudo o que é ligado à matéria, que pode ser medido, pesado, ou seja, quantificado. Para Descartes, “o universo material era uma máquina, nada além de uma máquina. Não havia propósito, vida ou espiritualidade na matéria”. Assim, o universo imaginado pela ciência moderna era físico e expulsava qualquer assertiva que não se enquadrasse nesse modelo.
A ciência desenvolvida nesse período avançou bastante com as descobertas de Newton, quando este propõe a lei da gravidade como uma força que rege todo o universo. A concepção de universo que emerge é determinista, já que é possível através das leis matemáticas determinar qualquer posição de um objeto no espaço. O universo tornava-se previsível.
Uma das conseqüências do avanço científico foi o desenvolvimento de uma tecnologia agressiva que destrói o meio ambiente. Essa tecnologia agressiva é fruto da concepção que se tinha de que a natureza deveria ser dominada e explorada para atender os interesses dos homens. Nessa perspectiva, todo o avanço tecnológico que causasse dano a natureza não era visto como ruim, pois a natureza era algo distinto de homem e que existia para atendê-lo. Não havia a visão atual de que somos partes integrantes da natureza e que a sua preservação garante a nossa existência.
A ciência passou então a ser um elemento de extrema potencialidade para o capitalismo, pois ampliava os meios de produção e de acumulação. A ciência foi envolvida pela lógica capitalista e passou a ser um fator de diferenciação entre os povos e se tornou num mecanismo de dominação das nações mais industrializadas sobre as menos. Ciência e tecnologia estão intimamente ligadas a esse processo de criação da sociedade ocidental

Conclusão

Vimos neste trabalho que os conhecimentos filosófico e científico influenciaram e continuam a influenciar a vida do homem fornecendo o conhecimento necessário para seu devido desenvolvimento, ainda que este desenvolvimento nem sempre se dê de forma racional. A função destes dois modos de pensar o mundo deveriam ser não somente apreender, mas também refletir sobre o mundo, ter uma compreensão melhor dele. O Conhecimento Filosófico, parte de axiomas gerais para inferir casos particulares, enquanto o Pensamento Científico, parte dos particulares para formular leis gerais, talvez a confluência destes dois tipos de conhecimento sejam a chave para se fazer a grande revolução na ciências, tanto físicas, quanto humanas, para uma melhora do nível de vida em todos os sentidos.
A concepção de ciências que emerge é: a de que o saber não pode estar enclausurado dentro de certos princípios epistemológicos, que se dizem eternos e que dariam validade definitiva para o conhecimento científico, já que a crença numa verdade definitiva na ciência pós-moderna não existe e o que há é um eterno processo de aproximação da realidade através da elaboração de teorias que procuram expressá-la de forma mais fiel possível; é uma visão de ciência que trata a realidade de forma orgânica e sistêmica, ao afirmar que não é possível construir um conhecimento mais elaborado do mundo se tratarmos os fenômenos de forma isolada, ou seja, como se eles existissem sem interagirem uns com outros, ao formar a teia da realidade; é uma ciência comprometida com o que é produzido, por ter uma implicação com o impacto gerado por suas descobertas. Nesta visão, não é possível pensar uma ciência que contribua para a destruição do meio ambiente e que aprofunde o fosso que separa as civilizações industrializas das não industrializadas. Sendo assim, é um conhecimento preocupado em promover o ser humano.
Enfim, a ciência pós-moderna é uma mudança de postura epistemológica diante dos fenômenos estudados. É uma busca, ao enfrentar os desafios da ciência contemporânea de forma mais aberta e dinâmica, tentando compreender que a natureza é algo que se torna cada vez mais fugaz e mutante, num mundo que está em constante transformação. É uma concepção de ciência que abarca a certeza na mudança e no transitório. Fazer ciência, então, é uma viagem sem destino e que não há um mapa (método) definitivo capaz de revelar o caminho mais adequado e rápido.


Bibliografia

ARANHA, MARIA LÚCIA DE ARRUDA – Filosofando: Introdução à Filosofia / Maria Lúcia de Arruda Aranha, Maria Helena Pires Martins. 2°ed. São Paulo: Moderna, 2000.

TELES, ANTONIO XAVIER – Introdução ao Estudo de Filosofia. 34°ed. São Paulo: Ática, 2000.





ALGUNS EXEMPLOS DE QUESTIONAMENTOS FILOSÓFICOS NO ÂMBITO DA
CIÊNCIA:
⇒ Quanto á objetividade científica: existe realmente a chamada objetividade científica? Qual a relação entre o sujeito que conhece e o objeto a conhecer?
⇒ Quanto á observação dos fatos: observo passivamente os fatos ou os vejo de acordo com os meus projetos?Será que não vejo as coisas de na medida em que elas corresponderem a determinado interesse? Os fatos acontecem independentemente de mim ou eu de certa forma crio os fatos?
⇒ Quanto aos fatos em si: será que toda teoria científica se apóia em fatos? Se assim é por que há teorias diferentes no campo científico sobre uma mesma realidade? Os fatos falam por si? Será que é verdade que contra fatos não há argumento?
⇒ Existe a neutralidade no conhecimento científico ou ele está marcado por relações políticas? Quais os interesses políticos que perpassam pelo conhecimento científico? Qual a relação entre ciência e poder?
Estes questionamentos filosóficos nos revelam o quanto é importante a reflexão filosófica sobre a ciência pois ela nos ajuda a lutar contra o cientificismo que se propõe como saber absoluto sobre as coisas e o homem. Mas ao mesmo tempo estes questionamentos evidenciam o papel da imaginação, do sujeito no processo do conhecimento científico. O conhecimento científico é algo profundamente humano.
Podemos então enfatiza do conhecimento cientifico, que este:
⇒ desconfia de nossas certezas, de nossa adesão imediata às coisas, da ausência de crítica.
⇒ Onde o senso comum vê muitas vezes fatos e acontecimentos, o conhecimento científico vê problemas e obstáculos.
⇒ Ele busca leis gerais para os fenômenos Ex.: a queda dos corpos é explicada pela lei da gravidade. Não acredita em milagres mas acredita na regularidade, constância, freqüência dos fenômenos.
⇒ É generalizador, pois reúne individualidades sob as mesmas leis, sob as mesmas medidas. Ex.: a química nos revela que a enorme variedade de corpos se reduz a um número limitado de corpos simples que se combinam de modos variados.
⇒ Aspira à objetividade enquanto o senso comum se caracteriza pela subjetividade.
⇒ Dispõe de uma linguagem rigorosa cujos conceitos são definidos de modo a evitar qualquer ambigüidade.
⇒ É quantitativo: busca medidas, padrões, critérios de comparação e de avaliação para coisas que parecem ser diferentes. Por isto, a matemática se constitui em instrumento importante de várias ciências.
⇒ Tem método rigoroso para a observação , experimentação e verificação dos fatos.
⇒ Diferentemente do Senso Comum que muitas vezes é marcado pelo sentimento, o conhecimento científico se pretende racional.

[1] Professora de filosofia Licenciada pela Universidade Federal de Pelotas

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